quinta-feira, 23 de fevereiro de 2012

Penal – Lei nº 11.343/06 – Inconstitucionalidades

Atualize seu vade mecum: o Senado suspendeu a execução de expressão constante na Lei nº 11.343/06, que estabelece normas para repressão à produção não autorizada e ao tráfico ilícito de drogas.
Veja:
Art. 33. Importar, exportar, remeter, preparar, produzir, fabricar, adquirir, vender, expor à venda, oferecer, ter em depósito, transportar, trazer consigo, guardar, prescrever, ministrar, entregar a consumo ou fornecer drogas, ainda que gratuitamente, sem autorização ou em desacordo com determinação legal ou regulamentar:
Pena - reclusão de 5 (cinco) a 15 (quinze) anos e pagamento de 500 (quinhentos) a 1.500 (mil e quinhentos) dias-multa.
[...]
§ 4º Nos delitos definidos no caput e no § 1º deste artigo, as penas poderão ser reduzidas de um sexto a dois terços, vedada a conversão em penas restritivas de direitos, desde que o agente seja primário, de bons antecedentes, não se dedique às atividades criminosas nem integre organização criminosa."
A Constituição estabelece que compete privativamente ao Senado Federal suspender a execução, no todo ou em parte, de lei declarada inconstitucional por decisão definitiva do Supremo Tribunal Federal (art. 52, inc. X). Atendendo ao comando constitucional, foi editada a Resolução nº 5, de 2012:

RESOLUÇÃO Nº 5, DE 2012.
Suspende, nos termos do art. 52, inciso X, da Constituição Federal, a execução de parte do § 4º do art. 33 da Lei nº 11.343, de 23 de agosto de 2006.
O Senado Federal resolve:
Art. 1º É suspensa a execução da expressão "vedada a conversão em penas restritivas de direitos" do § 4º do art. 33 da Lei nº 11.343, de 23 de agosto de 2006, declarada inconstitucional por decisão definitiva do Supremo Tribunal Federal nos autos do Habeas Corpus nº 97.256/RS.
Art. 2º Esta Resolução entra em vigor na data de sua publicação.
Senado Federal, em 15 de fevereiro de 2012.

Senador JOSÉ SARNEY
Presidente do Senado Federal
Veja a ementa do julgado declarou a inconstitucionalidade da expressão, com efeito ex nunc:

HABEAS CORPUS. TRÁFICO DE DROGAS. ART. 44 DA LEI 11.343/2006: IMPOSSIBILIDADE DE CONVERSÃO DA PENA PRIVATIVA DE LIBERDADE EM PENA RESTRITIVA DE DIREITOS. DECLARAÇÃO INCIDENTAL DE INCONSTITUCIONALIDADE. OFENSA À GARANTIA CONSTITUCIONAL DA INDIVIDUALIZAÇÃO DA PENA (INCISO XLVI DO ART. 5º DA CF/88). ORDEM PARCIALMENTE CONCEDIDA. 
1. O processo de individualização da pena é um caminhar no rumo da personalização da resposta punitiva do Estado, desenvolvendo-se em três momentos individuados e complementares: o legislativo, o judicial e o executivo. Logo, a lei comum não tem a força de subtrair do juiz sentenciante o poder-dever de impor ao delinqüente a sanção criminal que a ele, juiz, afigurar-se como expressão de um concreto balanceamento ou de uma empírica ponderação de circunstâncias objetivas com protagonizações subjetivas do fato-tipo. Implicando essa ponderação em concreto a opção jurídico-positiva pela prevalência do razoável sobre o racional; ditada pelo permanente esforço do julgador para conciliar segurança jurídica e justiça material. 
2. No momento sentencial da dosimetria da pena, o juiz sentenciante se movimenta com ineliminável discricionariedade entre aplicar a pena de privação ou de restrição da liberdade do condenado e uma outra que já não tenha por objeto esse bem jurídico maior da liberdade física do sentenciado. Pelo que é vedado subtrair da instância julgadora a possibilidade de se movimentar com certa discricionariedade nos quadrantes da alternatividade sancionatória. 
3. As penas restritivas de direitos são, em essência, uma alternativa aos efeitos certamente traumáticos, estigmatizantes e onerosos do cárcere. Não é à toa que todas elas são comumente chamadas de penas alternativas, pois essa é mesmo a sua natureza: constituir-se num substitutivo ao encarceramento e suas seqüelas. E o fato é que a pena privativa de liberdade corporal não é a única a cumprir a função retributivo-ressocializadora ou restritivo-preventiva da sanção penal. As demais penas também são vocacionadas para esse geminado papel da retribuição-prevenção-ressocialização, e ninguém melhor do que o juiz natural da causa para saber, no caso concreto, qual o tipo alternativo de reprimenda é suficiente para castigar e, ao mesmo tempo, recuperar socialmente o apenado, prevenindo comportamentos do gênero. 
4. No plano dos tratados e convenções internacionais, aprovados e promulgados pelo Estado brasileiro, é conferido tratamento diferenciado ao tráfico ilícito de entorpecentes que se caracterize pelo seu menor potencial ofensivo. Tratamento diferenciado, esse, para possibilitar alternativas ao encarceramento. É o caso da Convenção Contra o Tráfico Ilícito de Entorpecentes e de Substâncias Psicotrópicas, incorporada ao direito interno pelo Decreto 154, de 26 de junho de 1991. Norma supralegal de hierarquia intermediária, portanto, que autoriza cada Estado soberano a adotar norma comum interna que viabilize a aplicação da pena substitutiva (a restritiva de direitos) no aludido crime de tráfico ilícito de entorpecentes. 
5. Ordem parcialmente concedida tão-somente para remover o óbice da parte final do art. 44 da Lei 11.343/2006, assim como da expressão análoga “vedada a conversão em penas restritivas de direitos”, constante do § 4º do art. 33 do mesmo diploma legal. Declaração incidental de inconstitucionalidade, com efeito ex nunc, da proibição de substituição da pena privativa de liberdade pela pena restritiva de direitos; determinando-se ao Juízo da execução penal que faça a avaliação das condições objetivas e subjetivas da convolação em causa, na concreta situação do paciente.
(HC 97256, Relator(a): Min. AYRES BRITTO, Tribunal Pleno, julgado em 01/09/2010, DJe-247 DIVULG 15-12-2010 PUBLIC 16-12-2010 EMENT VOL-02452-01 PP-00113 RT v. 100, n. 909, 2011, p. 279-333)

15/05/2012 - ATUALIZAÇÃO
Por maioria de votos, o Plenário do Supremo Tribunal Federal (STF), no julgamento do Habeas Corpus nº 104.339declarou a inconstitucionalidade de parte do artigo 44 da Lei 11.343/06, em relação à vedação de concessão de liberdade provisória nos casos de tráfico de drogas.
O dispositivo questionado determinava que:


Art. 44. Os crimes previstos nos arts. 33, caput e § 1o, e 34 a 37 desta Lei são inafiançáveis e insuscetíveis de sursis, graça, indulto, anistia e liberdade provisória, vedada a conversão de suas penas em restritivas de direitos.
No julgamento, se argumentou que a vedação da liberdade provisória “é incompatível com o princípio constitucional da presunção de inocência e do devido processo legal, dentre outros princípios”.
Constou também que, ao afastar a concessão de liberdade provisória de forma genérica, a norma retira do juiz competente a oportunidade de, no caso concreto, “analisar os pressupostos da necessidade do cárcere cautelar em inequívoca antecipação de pena, indo de encontro a diversos dispositivos constitucionais”.
A lei estabeleceria um tipo de regime de prisão preventiva obrigatório, na medida em que torna a prisão uma regra e a liberdade uma exceção. Foi lembrado que a Constituição Federal de 1988 instituiu um novo regime no qual a liberdade é a regra e a prisão exige comprovação devidamente fundamentada.
A impossibilidade de pagar fiança em determinado caso não impede a concessão de liberdade provisória, pois são coisas diferentes. A Constituição não vedou a liberdade provisória e sim a fiança.
Há uma necessidade de permanente controle da prisão por órgão do Poder Judiciário que nem a lei pode excluir. Afirmou-se também que cabe ao magistrado e, não ao legislador, verificar se se configuram ou não, em cada caso, hipóteses que justifiquem a prisão cautelar.
O inteiro teor do voto ainda não foi divulgado.

Fonte: Supremo Tribunal Federal

16/05/2012 - ATUALIZAÇÃO - Comentário do Prof. Eugênio Pacelli sobre a inafiançabilidade
"Quartas com Lei e com Direito – 16.05.2012 – Esclarecendo a inafiançabilidade constitucional e a Lei 12.403/11.

Já comentamos essa questão, mas em menor extensão. Reiteramos, agora mais detidamente, em razão de fatos supervenientes.
O Supremo Tribunal Federal vem de reconhecer a inconstitucionalidade da vedação da liberdade provisória contida na chamada Lei de Drogas. Já assentamos nesse espaço a absoluta inadequação do texto constitucional de 1988, seguido pela Lei 12.403, ao manter expressões sem qualquer contexto ou afinidade com a nova ordem, e, particularmente, com as garantias individuais que emanam daquela Carta Política. A expressão “inafiançabilidade” e a outra “liberdade provisória” talvez não sejam apenas inadequadas, mas, mais que isso, são também, destituídas de alcance prático.
Constituinte e legislador (12.403/11) pretendiam retroceder por quase um século, ao insinuar a impossibilidade de restituição da liberdade nos casos de flagrante delito em determinados crimes (hediondos, racismo, tortura etc.), apondo-lhes o signo da “inafiançabilidade”.
Ora, desde o ano de 1977, a Lei 6.416 já alterara o arcaico CPP, estabelecendo a restituição da liberdade (então liberdade provisória) sempre que ausentes as razões da preventiva. Era o tempo do antigo art. 310, parágrafo único, CPP. E com ele não mais fazia diferença a infração ser ou não inafiançável, posto que a regra era a liberdade sem fiança, cabível para a generalidade dos crimes, incluindo aqueles mais graves que os chamados “inafiançáveis”.
O constituinte, portanto, chegou atrasado! Inafiançabilidade não mais impedia a liberdade, sem a necessidade de fiança. Ela (inafiançabilidade) somente fazia sentido quando, ao tempo do CPP (1941), a única forma de restituição da liberdade após o flagrante era mediante fiança! Isso havia acabado em 1977!
Já a Lei 12.403/11, ao repetir a bobagem constitucional (inafiançabilidade e liberdade provisória), foi além: vedou a fiança para os crimes inafiançáveis – o que é lógico!, mas não criou nenhuma outra restrição mais onerosa para tais delitos. Chegamos a sugerir, à época da votação, que se instituísse a CAUÇÃO, em espécie e em maior proporção para aqueles crimes, de modo a atender à censura constitucional. Se eram inafiançáveis, não o seriam “INCAUCIONÁVEIS”!
Resumo da ópera: com a decisão, acertada do STF, sempre poderá caber (não é obrigatória!) a restituição da liberdade para tais crimes, com a imposição de alguma ou de algumas cautelares, MENOS A FIANÇA. Para os crimes menos censurados na Constituição (afiançáveis) serão, em TESE, cabíveis TODAS AS CAUTELARES. Somente o exercício sereno e racional da jurisdição poderá reparar a desigualdade de tratamento legislativo.
Por fim: medidas cautelares exigem necessidades acautelatórias (daí o nome!); tais necessidades não podem ser supostas, em abstrato, nem pelo constituinte! Dependem de exame concreto, cuja titularidade é exclusiva do magistrado, único diante da realidade dos fatos. E por ordem do constituinte, afinal, “ninguém será preso ou mantido preso senão por ordem escrita da autoridade judiciária”.

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